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Inovação Uniemp

Print version ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp vol.1 no.3 Campinas Nov./Dec. 2005

 

 

Sobram razões para transformar biodiversidade em produtos

 

 

por GERMANA BARATA

 

 

Desde que a maior empresa nacional de cosméticos, a Natura, inaugurou sua primeira loja na capital francesa, e mundial, da estética, em 22 de abril, os empresários brasileiros vêm celebrando a conquista. A data, cuidadosamente escolhida, deverá marcar também o descobrimento do país como desenvolvedor de produtos de qualidade inspirados na maior diversidade biológica do mundo, a amazônica. Não se trata de uma competição desigual. A idéia é tirar vantagem do conceito de biodiversidade e desenvolvimento sustentável e conquistar uma fatia do mercado cosmético que movimentou cerca de US$ 201 bilhões em 2003.

Além de agregar valor ao produto nacional, o desenvolvimento sustentável de produtos da floresta ajuda a preservar o meio ambiente e as comunidades locais. A bem sucedida linha Ekos, iniciada em 2000, pela Natura, por exemplo, desenvolve xampus, cremes e sabonetes a partir da copaíba, cupuaçu, murumuru, castanha-do-Brasil, cumaru e açaí, e perfumes à base de priprioca, breu branco e louro, extraídas por comunidades de mais de 10 microrregiões do país, entre elas as do médio Juruá (AM) e de Iratapuru (AP). A linha garante a certificação dos ativos da floresta e hoje já responde por cerca de 10% do faturamento da empresa que, em 2004, chegou a R$ 2,5 bilhões. Sem o conceito da biodiversidade, dificilmente a empresa conseguiria lançar-se em sua aventura em Paris. Nos próximos três anos, a Natura pretende investir cerca de 16 milhões de euros durante sua permanência na França. Aberta em 1969, em São Paulo, a empresa já comercializa, de porta em porta, seus produtos na Argentina, Chile, Bolívia e Peru e pretende chegar ao México neste segundo semestre.

 

 

Outro exemplo vem da paraense Chamma da Amazônia, que em dezesseis anos de existência já inaugurou mais de 30 pontos de vendas em todo o país e possui franquias em Portugal. A empresa é parceira de comunidades ribeirinhas que cultivam ervas e raízes para a produção de colônias, coletam sementes para a confecção das biojóias, e confeccionam cestos a partir da palmeira de guarumã e miriti, que além de funcionarem como embalagens podem assumir outras funções, evitando seu descarte pelo consumidor.

Para incentivar o investimento de empresas em produtos certificados da floresta amazônica, a organização não-governamental Amigos da Terra/Amazônia Brasileira criou um acordo entre a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) e o Grupo de Compradores de Produtos Florestais Certificados. A idéia é firmar critérios comerciais justos que atendam às necessidades de preservação do ambiente e das comunidades locais, que utilizam espécies da floresta ou recorrem ao cultivo de espécies nativas.

Nos últimos anos o consumo de cosméticos cresceu bastante, principalmente no Brasil, sendo superado apenas pela China. Até o momento, o país ocupa o 7º lugar no setor de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos (Euromonitor, 2003), resultado da produção das 1.258 empresasque movimentam R$13,2 bilhões ao ano. No entanto, apenas 16 delas, quase todas pequenas, encontram-se na região Norte, deixando clara a necessidade de se investir na capacitação tecnológica e profissional da região que abriga a floresta amazônica. O Relatório Plantas e Ervas Medicinais das Micro e Pequenas Empresas da Amazônia, do Serviço de Apoio à Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), revela que 28% dos produtos desenvolvidos em 2000 eram cosméticos, perdendo posição apenas pelos medicamentos, com 41%.

 

 

 

 

MATÉRIA-PRIMA AMAZÔNICA

Apesar do desempenho da indústria brasileira, João Carlos Basílio da Silva, presidente da Abihpec, lembra que a tecnologia do setor ainda vem de fora, o que limita a criatividade e inovação do empresariado brasileiro. Faltam investimentos em pesquisas para transformar conhecimento em capital. "A tecnologia é necessária porque resolve o problema de isolamento da Amazônia, com a valorização de seus produtos", afirma Imar César de Araújo, diretor do Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA). O Centro é voltado para a promoção de inovação tecnológica gerada por processos e produtos obtidos a partir da biodiversidade da Amazônia. Até 2004, a instituição já havia recebido R$ 38,8 milhões, resultado de esforços da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), ministérios do Meio Ambiente e da Ciência e da Tecnologia, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e do setor privado.

"Hoje a Amazônia vende casquinhas e folhinhas", reconhece Araújo, "mas queremos vender essências e óleos", importantes matérias-primas para a indústria de cosméticos. No entanto, para a conquista definitiva do mercado externo, Lauro Barata, químico de produtos naturais da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita ser preciso investir na padronização de insumos provenientes da biodiversidade. "A padronização das matérias primas é praticamente inexistente no país, mesmo quando consideramos as grandes indústrias extrativas de São Paulo", afirma. Óleos essenciais como os usados pela Natura na linha Ekos exigem um alto controle de qualidade que garanta a produção em larga escala, preservando as propriedades de interesse. O óleo de andiroba, por exemplo, custa US$ 2 direto do produtor, mas atinge US$ 23 depois de padronizado. O CBA já oferece estrutura laboratorial e serviços para as empresas que pretendem adequar sua cadeia produtiva e estabelecer padrões para fazer produtos de melhor qualidade e valor agregado.

Dados da Abihpec mostram que o setor apresentou déficit comercial até 2001. A partir de então, passou a apresentar crescimento, registrando nos últimos quatro anos uma elevação de 8,4%, mais do que os demais setores industriais, cuja média foi de 2,4% no mesmo período. Entre os fatores que levaram à progressiva preferência pelos produtos nacionais no lugar dos importados está o emprego de tecnologia de ponta que incrementou a produtividade e beneficiou a oferta de preços mais atraentes dos cosméticos brasileiros. Em média houve um decréscimo em 13,1% nos produtos cosméticos e 24,1% nos de higiene, ambos no mercado interno. Além disso, de acordo com a Associação, mais produtos foram lançados para atender novas demandas tais como os produtos anti-envelhecimento e aqueles voltados para o público masculino.