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Inovação Uniemp

versão impressa ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp v.2 n.2 Campinas abr./jun. 2006

 

 

Ainda é difícil comercializar novos produtos gerados pela pesquisa universitária

 

 

PAÍSES COMO O BRASIL, AINDA EM PROCESSO DE CRIAR UMA CULTURA DE LICENCIAMENTO, PRECISAM CONSTRUIR SEUS PORTFÓLIOS DE PATENTES

 

 

por GABRIEL ATTUY

 

 

Focados principalmente em desenvolver novas idéias e expandir a base local de conhecimento, universidades e centros tecnológicos são obrigados a se voltar para o mercado e arriscar investimentos em depósitos de patentes e estágios avançados de pesquisa na hora de tentar licenciar novas tecnologias. Se essa é uma tarefa difícil para instituições como a Universidade de Stanford, que fecha de 80 a 100 novos contratos de licenciamento por ano, muito mais ainda para países como o Brasil que — comparados a regiões grandes desenvolvedoras de tecnologia como Estados Unidos, Japão, Coréia e Índia — estão no início do processo para solidificar uma cultura de licenciamentos tecnológicos. "Ainda nos falta experiência para comercializar a tecnologia resultante de pesquisa na universidade", afirma Roberto Lotufo, diretor-executivo da Agência de Inovação da Universidade Estadual de Campinas (Inova/Unicamp).

Para Jon Sandelin, diretor do escritório de licenciamento da Universidade de Stanford, na Califórnia (EUA), é necessário um trabalho de longo prazo e a construção de uma espécie de portfólio de patentes para que o processo de licenciamento de novas tecnologias possa ser bem-sucedido. "Assim como um investidor do mercado financeiro cria um portfólio de ações, sabendo que apenas cerca de uma em cada dez vai trazer retorno significativo, nossa experiência é que ao redor de um de cada cem dos nossos investimentos terá sucesso", diz Sandelin. A receita de Stanford com licenciamento de tecnologia cresceu exponencialmente desde a década de 1970. De 1969 a 1980 a receita da universidade foi de US$ 4 milhões, passando para US$ 40 milhões de 1981 a 1990, e cerca de US$ 400 milhões de 1991 a 2000. "No entanto, quase a totalidade da receita da década de 1990 foi proveniente de descobertas e desenvolvimentos realizados nos anos 1970", afirma Sandelin.

 

 

Os investimentos de longo prazo para a criação de um portfólio de patentes também são considerados no desenvolvimento de cada produto, já que o fator que determina o valor para licenciamento é a demanda do mercado, e não o custo do processo inicial. "Os investimentos em pesquisa normalmente já foram feitos quando se pensa em comercializar a tecnologia. Dessa forma, o que o mercado pagará pela tecnologia, na forma de produto, pode não ter qualquer relação com o custo inicial", explica Rosana Ceron Di Giorgio, diretora de propriedade intelectual e desenvolvimento de parcerias da Inova/Unicamp.

Ela cita o exemplo de uma tecnologia desenvolvida pela Inova e licenciada para a companhia Bunge, o pigmento branco BiPhor. "Trata-se de nanotecnologia utilizada para produzir um pigmento branco para uso em tintas à base de água. Apesar de o produto ter um custo inferior ao do seu concorrente no mercado, o dióxido de titânio, o seu preço deverá ser similar porque ele apresenta diferenciais significativos como menor custo, a característica de ser mais branco e conferir melhor qualidade à camada de tinta".

 

REAL VALOR DE MERCADO

"Novas tecnologias são avaliadas com base em sua fase de desenvolvimento e potenciais mercados, além de possíveis ou conhecidos concorrentes nesses mercados", afirma Catherine Innes, diretora do escritório de desenvolvimento tecnológico da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, que realiza de 30 a 50 contratos de licenciamento por ano. Além desses fatores, são examinadas possíveis barreiras para produção em escala e possibilidade de proteção por patente. "Se uma tecnologia promissora tiver limites em relação à proteção por patente, ela terá poucas chances de ser desenvolvida; o mesmo aconteceria em relação a uma tecnologia com boas perspectivas de mercado, mas possíveis problemas de produção em escala", comenta.

Para determinar se vale a pena investir em um novo produto é necessário considerar todos os fatores, já que mesmo uma tecnologia com claros benefícios para a sociedade pode ser inviável. "Alguns anos atrás desenvolvemos em Stanford um sistema de transmissão para carros que aumentaria o rendimento do veículo de 10% a 12%. No entanto, isso foi na época em que a gasolina era muito barata nos Estados Unidos e a melhoria significaria aumentar em algumas centenas de dólares o preço de um automóvel. Nenhuma das montadoras se interessou pelo produto alegando que os consumidores não pagariam mais pela redução no consumo de combustível", conta Sandelin.

 

 

Segundo Rosana di Giorgio, o procedimento mais comum para determinar o valor de uma nova tecnologia é o método do fluxo de caixa descontado, onde são consideradas as receitas provenientes das vendas do produto no período, custos de desenvolvimento, despesas com a equipe de vendas, pagamento de royalties, impostos e outros. "Como saída temos o lucro e o valor presente do negócio. Então podemos concluir sobre a viabilidade do negócio considerando o valor que o mercado pagará pela tecnologia e demais condições adotadas".

 

MODELO DE PARCERIAS

A exemplo da Inova/Unicamp, grande parte dos desenvolvimentos tecnológicos realizados no Brasil são fruto de parcerias entre universidades e empresas. De acordo com Rosana, cerca de 80% dos projetos da agência, que fecha em média 12 contratos de licenciamento por ano envolvendo cerca de 25 patentes, são baseados em desenvolvimento conjunto. É uma média considerada alta para o Brasil e para a América Latina, segundo a diretora que ressalta, porém, a fase inicial em que se encontram as atividades de licenciamento no país. "O volume de licenciamentos ainda não constitui amostra significativa para se avaliar o nível de inovação do país", diz.

 

 

Para Lotufo, isso demonstra o grande potencial para licenciamento de tecnologias no Brasil. "No entanto, conforme orientação de consultores internacionais em escritórios de transferência de tecnologia universitária, só faz sentido investir num escritório de TT se houve quantidade e qualidade de pesquisa. Na Unicamp, existem essas duas características, que permitem a Inova obter esses resultados expressivos de licenciamentos". Entre as novas iniciativas da agência está o desenvolvimento do Programa de Investigação Tecnológica (PIT), que irá analisar a viabilidade técnica e econômica de 60 patentes. A metodologia busca analisar o estágio da tecnologia, prova de conceito, análise econômica, viabilidade financeira e diversos outros fatores que possam ajudar ou impedir a inovação.

 

ESTADOS UNIDOS E CORÉIA

O diretor do Inova cita a Coréia como um exemplo a ser seguido. "Não há dúvida que os EUA são os que mais sabem usar a inovação como alavanca para o desenvolvimento tecnológico e econômico de um país. Mas a Coréia é um exemplo para nós, pois tem alguns números parecidos com os do Brasil na produção de pesquisa científica e foi um país que soube dar um salto em inovação tecnológica nos últimos 15 anos. Isso nos traz uma pergunta incômoda: por que também não fomos capazes de acompanhar esse ritmo?".

De 1992 a 2002 a receita com royalties provenientes de licenciamento tecnológico nos Estados Unidos, considerando todas as universidades, passou de US$ 248 milhões para mais de US$ 1,2 bilhão, com mais de 7,7 mil patentes depositadas e cerca de 4,6 mil contratos de licenciamento.