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Inovação Uniemp

versão impressa ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp v.2 n.4 Campinas set./out. 2006

 

 

Corporación Cooperativa Mondragón - MCC: cooperativismo, autogestão e competitividade

 

 

ALESSANDRA DE AZEVEDO e LEDA GITAHY

 

 

É possível unir competitividade e inovação tecnológica com cooperativismo e autogestão? A Corporación Cooperativa Mondragón - MCC, há 50 anos vem demonstrando que esta união é viável.

A MCC reúne 104 cooperativas e está estruturada em três grupos: financeiro, industrial e de distribuição, além de contar com onze centros de pesquisa e desenvolvimento, uma universidade (com três faculdades) e um centro de formação cooperativa e empresarial . É o primeiro grupo empresarial do País Basco e ocupa o sétimo lugar no ranking das principais empresas espanholas. Em 2004 teve um faturamento de 10,459 bilhões de euros, contando com 70.884 trabalhadores, segundo o seu Informativo Anual. Desde sua formação, em 1956, Mondragón teve como pilares o cooperativismo, a educação e a inovação tecnológica.

Sua forma de organização é complexa e interessante por apresentar uma estrutura como a de uma pirâmide invertida, sendo o topo formado por representantes de todas as 104 cooperativas e o vértice, onde está a cúpula da MCC, com a missão de planejar as estratégias, a gestão corporativa global e desenvolver atividades de apoio às cooperativas. Assim, a independência de gestão das cooperativas é preservada, o que permite a convivência de múltiplas formas de gestão e a utilização de diversas ferramentas administrativas, sem perder o foco nos princípios do cooperativismo.

A história da MCC pode ser dividida em três etapas: a primeira, que vai de 1955 a 1970, é marcada pelo surgimento das primeiras cooperativas e instituições de suporte; na segunda, entre as décadas de 70 a 90, as cooperativas se agrupam por proximidade geográfica; e a terceira etapa, a partir dos anos 1990, é quando se forma a corporação e a reorganização setorial, voltando-se para o mercado/produto. Vale destacar que os mecanismos de solidariedade e de intercooperação estiveram presentes durante toda a história da MCC e, em momentos de crise, possibilitaram um impacto menor na corporação do que no mercado em geral.

Entre 1955-1970 surgem 41 cooperativas e três instituições de suporte, que trazem soluções para os problemas encontrados, tais como falta de crédito para financiamentos, perda dos direitos trabalhistas, necessidade de pagamento de royalties e limitações de exportação dos produtos fabricados pelas cooperativas, impostas pelas licenciadoras.

Para a falta de crédito, foi criada a Caja Laboral, com o objetivo de promover a captação de poupança popular (cooperativas e cooperados) e canalizar esses recursos para o desenvolvimento cooperativo. Para compensar a perda dos direitos trabalhistas foi criada a Lagun-Aro, responsável pela previdência social. Quanto ao pagamento de royalties, foram criados departamentos de P&D nas cooperativas, para desenvolver capacitação interna e oferecer ao mercado produtos próprios. A partir de 1962 a Escola Profissional, passa a se chamar Escola Politécnica, amplia a oferta de cursos (mecânica, eletricidade, fundição, moldes e automação) e oferece o suporte teórico necessário para a aprendizagem da tecnologia licenciada e o desenvolvimento de tecnologia própria.

A segunda fase (1970-1990) é marcada pela continuidade do crescimento do número de cooperativas, das vendas e do número de postos de trabalho, além da criação de vários centros de P&D. Porém, na década de 80, a inserção da Espanha no Mercado Comum Europeu e a globalização provocam uma crise geral na economia do país, que obriga as cooperativas a mudarem suas estratégias de produção e de mercado para sobreviver.

Nessa etapa há um esforço de se criar uma organização mais estruturada, visando o desenvolvimento de espaços e mecanismos comuns que assegurassem tanto a independência econômica como a tecnológica das cooperativas. Gradativamente os agrupamentos por proximidade geográfica são substituídos por novas formas de organização. Além disso, um conjunto de políticas foi implementado: capitalização de resultados, flexibilização de calendário, transferência de sócios, redistribuição e recomposição financeira (1).

Nesse período são criadas cooperativas de suporte tecnológico e organizacional, tais como o Centro de Investigación - Ikerlan, a Escuela Politécnica Txorierri, o Centro de Formação em Administração e Direção de Empresas - Eteo, o Centro de Formación - Otalora. As cooperativas industriais, independentemente dos centros de apoio, criaram seus próprios departamentos internos de P&D.

A terceira fase (1990 até hoje) se caracteriza pelo processo de evolução organizacional que transformou o grupo de cooperativas Mondragón em uma corporação: Mondragón Corporación Cooperativa - MCC(*).

As razões apresentadas para criar Mondragón Corporación Cooperativa foram: 1) ter maior poder de penetração no mercado e aumentar a sinergia entre as empresas; 2) reduzir o custo do capital e aumentar a possibilidade de financiar e desenvolver atividades empresariais o que individualmente não seria viável; 3) gerar mais riqueza e desenvolvimento tecnológico, melhorar a eficiência e a competência, em acordo com os princípios básicos do cooperativismo: solidariedade, intercooperação e transformação social; 4) tornar importante estrategicamente a diversificação de produto nos agrupamentos setoriais, para a realização de relações horizontais e verticais (2).

Os fundos geridos pela Caja Laboral e os demais criados para responder às necessidades de financiamento e desenvolvimento das cooperativas são geridos por duas entidades jurídicas pertencentes à MCC, que dão cobertura institucional e canalizam os recursos: MCC Inversiones e a Fundación MCC. Atualmente existem na MCC cinco fundos intercooperativos. Segundo a Memoria de Sostenibilidad 2003 os fundos intercooperativos são uma resposta solidária das cooperativas que compõem a MCC em prol do desenvolvimento conjunto de todas as cooperativas.

A sinergia entre as cooperativas foi estimulada desde o início da experiência e hoje existe uma estrutura consolidada de solidariedade financeira, na qual a formação de diversos fundos possibilita o apoio às cooperativas em períodos de crise. Já as sinergias tecnológicas e de mercado vêm solicitando maior atenção devido à importância competitiva que adquiriram nas últimas duas décadas. Em 2004 foi aprovado um plano de ciência e tecnologia que visa fortalecer tanto o desenvolvimento tecnológico quanto as vendas conjuntas.

Manter o equilíbrio entre solidariedade e competitividade é o grande desafio diário, pois implica na articulação de múltiplos atores e interesses, através de formas democráticas de gestão. O importante fator de competitividade do grupo atualmente é que a MCC não está interligada somente pela participação financeira, e sim por um acordo entre as partes para administrar as cooperativas com um modelo de gestão que transcende a capacidade individual de cada cooperativa e promove a eficiência coletiva. Com esse arranjo organizacional em constante mudança, as cooperativas buscam ser competitivas de diversas maneiras. Vale destacar a importância dada à inovação tecnológica, a preocupação com a produtividade e a qualidade dos produtos e, principalmente, de seus recursos humanos. Esse modelo, extremamente criativo, de autogestão e de intercooperação transformou a MCC no sétimo grupo empresarial da Espanha e suas cooperativas anualmente ganham vários prêmios de reconhecimento de eficiência empresarial. A experiência da MCC demonstra que é possível combinar autogestão e solidariedade e manter-se competitivo em um mercado globalizado.

 

Alessandra Azevedo é doutoranda do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências, da Unicamp.

Leda Gitahy é professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências, da Unicamp.

 

 

NOTA

*) O nome se justifica assim:Mondragón identifica a origem da experiência e tem reconhecimento internacional como programa de movimento cooperativista. Corporação identifica uma entidade diversificada em seus componentes operando sobre uma unidade de direção e permite a utilização do termo "grupo". Cooperativa incorpora valores universais de solidariedade, democracia e autogestão. (Compêndio de normas em vigor no congresso de MCC, 1995)

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1) Azevedo A, Gitahy L. "É possível cooperativas serem competitivas? O caso da Corporación Cooperativa Mondragón - MCC mostra que sim". VI Jornadas Latinoamericanas de Estudios Sociales de la Ciencia y la Tecnología, VI Esocite, em Bogotá/ Colombia, 2006.

2) Bakaikoa, Balenren et all. Mondragón Corporación Cooperativa-MCC, Grupos empresariales de la economia social en España. Ciriec, 1999.

Informe Anual MCC, Modragón, 2004.