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Inovação Uniemp

Print version ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp vol.3 no.1 Campinas Jan./Feb. 2007

 

 

 

Na ponta dos dedos, na ponta dos pés

 

 

por PATRÍCIA MARIUZZO

 

 

BOSCH APOSTA NA EDUCAÇÃO E CULTURA PARA PROMOÇÃO SOCIAL

Luzes apagadas, silêncio. As crianças mantêm os olhos fixos na pequena caixa de papelão à frente da classe. Abrem-se as cortinas e o espetáculo começa. Entra em cena um personagem conhecido, o saci-pererê, negrinho de gorro vermelho e de uma perna só. Desde setembro do ano passado, este e outros personagens do folclore brasileiro se juntam à Branca de Neve e à Cinderela, em apresentações do teatro de fantoches que encanta centenas de crianças de escolas das redes municipal e estadual de Campinas, interior de São Paulo. Trata-se do projeto "Bonecas e histórias: tecendo a cultura brasileira", que tem o objetivo de oferecer aos educadores um instrumento pedagógico que ajude no processo de aprendizagem dos alunos e desenvolva o gosto pela leitura. O projeto é patrocinado pela Bosch, multinacional alemã do ramo de autopeças, por meio da Lei Rouanet. A empresa distribui um kit composto por um livro didático, um livro de estórias e quatro conjuntos de fantoches (36 bonecos), em 75 escolas de educação infantil e fundamental.

O "Bonecas e histórias" foi idealizado pelo Grupo Primavera, ONG campineira que mantém desde 1997 uma oficina de bonecas em sua sede. "A idéia que o Primavera nos trouxe ano passado utiliza a cultura para melhorar a educação e incentivar a leitura. Isso vai de encontro aos objetivos da política social que praticamos, por isso decidimos apoiar o programa integralmente", conta Carlos Abdala, gerente de relações corporativas da multinacional e diretor administrativo do Instituto Bosch. Segundo ele, os programas de responsabilidade social em que a empresa atua têm três frentes de ação: preservação do meio ambiente e saúde preventiva; educação, especialmente para jovens e adultos, e incentivo à cultura. Os fantoches representam personagens do folclore brasileiro e dos contos de fadas. Para permitir um melhor aproveitamento do material o Grupo realiza oficinas de capacitação dos educadores, sobre técnicas de como contar histórias em sala de aula. Para Paula Hauptmann, responsável pela área de relações institucionais do Grupo Primavera, a qualificação dos educadores é peça central para obter bons resultados. "Nos workshops de capacitação os professores aprendem como o fantoche pode ser um poderoso recurso pedagógico, uma ferramenta para a inserção dos mais variados conteúdos. O projeto não oferece soluções prontas, e sim meios para que o educador descubra formas de encantar seus alunos", diz.

O kit que as escolas recebem tem ainda alguns bonecos inacabados para que professores e alunos inventem seus próprios personagens e histórias. No final do ano, a melhor história ganha um computador. "A escola só se torna atraente para o aluno quando os professores estão motivados, qualificados e providos de recursos pedagógicos. É fato que essa é uma condição mais difícil de ser encontrada na rede pública", acredita Hauptmann. Segundo ela, o projeto tem tido boa recepção entre alunos e educadores. "Alguns depoimentos de professores são emocionantes, como os que relatam o "resgate" de alunos que já se encontravam à margem do aprendizado", conta ela. A meta do projeto para este ano é ampliar o programa para as creches do município e para outras cidades da região metropolitana de Campinas.

 

FOCO EM JOVENS MULHERES

"O ‘Bonecas e histórias’ tem forte sinergia com a nossa oficina artesanal de bonecas onde os fantoches são produzidos por 11 artesãs que um dia já passaram pelos programas de formação do Primavera e hoje são profissionais", explica Hauptmann. Em 2006 a oficina, que foi criada para ser uma das fontes de sustentabilidade da ONG, produziu 18 mil fantoches para o projeto, e mais duas mil bonecas e bonecos que são comercializados em pontos de venda de Campinas ou na sede do Grupo. Com mais de 20 anos atuando numa das regiões mais pobres e violentas de Campinas, o Grupo Primavera investe na formação de jovens mulheres. Atualmente a ONG atende mais de 200 meninas com idade entre 11 e 17 anos em projetos que vão de reforço escolar à capacitação profissional — várias técnicas de bordado que são aplicadas na oficina de bonecas e treinamento para formar recepcionistas que são encaminhadas para grandes empresas. Todos os projetos desenvolvidos pelo Grupo são permeados pela noção de que a mulher é um agente de transformação social pelo seu papel multiplicador, tanto na família como no trabalho.

 

 

NA PONTA DOS PÉS

Na área de incentivo cultural, outro projeto apoiado pela Bosch, em conjunto com outras empresas, é o "Dança e Cidadania", que promove a inclusão social por meio da dança. Hoje 450 alunos têm aulas de balé clássico e sapateado americano em 33 escolas de bairros carentes de Campinas. Nas aulas são mantidos os padrões de alta qualidade de ensino da dança; as crianças recebem uniforme, alimentação e transporte. A partir do projeto inicial foi criada a Cia. de Dança de Campinas para abrigar os alunos mais talentosos. Para formar bailarinos profissionais, a Cia. oferece formação completa: aulas diárias de dança clássica e moderna, técnica teatral e inglês, para 25 alunos. Lá também estão sendo treinados professores. "A idéia é ter um morador dando aula em cada bairro que atendemos", explica Lúcia Teixeira, diretora geral do projeto.

Um dos principais resultados de todo o trabalho é a montagem do espetáculo O quebra nozes, de Tchaikovsky. O elenco é formado pelas crianças do "Dança e Cidadania", os solistas são os bailarinos da Cia. de Dança de Campinas e a música é executada pela Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas, que também recebe apoio da Bosch. O projeto envolve também os familiares em atividades paralelas. Os pais dos alunos podem fazer cursos de cenografia e iluminação de palco e as mães têm aulas de corte e costura para ajudarem na confecção de figurinos dos pequenos bailarinos. Famílias que nunca haviam entrado num teatro passam a freqüentá-lo, não só como espectadores, mas também como profissionais. "É importante a criança ter a família envolvida naquilo que ela está fazendo; tem que ser um progresso conjunto, dentro e fora de casa", acredita Lúcia. No ano passado, o mesmo espetáculo teve cinco apresentações, todas lotadas. Segundo a professora, é um dos um dos únicos espetáculos no mundo com acompanhamento de orquestra e crianças no palco. "Quando conseguimos colocar tanta gente fazendo balé, percebemos que a justiça social se faz pela oportunidade. Quando as pessoas têm as mesmas oportunidades, conseguem levar os projetos adiante. Vence quem tem vontade e talento", completa Lúcia.