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Inovação Uniemp

versão impressa ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp v.3 n.2 Campinas mar./abr. 2007

 

 

Tecnologias de informação e comunicação: inovação é quase um sinônimo

 

 

por BRUNO BUYS

 

 

 

Dois termos que se mesclam quase sem distinção: tecnologias da informação e comunicação (TIC) e inovação. O ritmo acelerado de lançamentos e substituição de padrões na informática faz com que a novidade seja muito mais a regra do que a exceção. É um mercado ágil e de alta competição, com possibilidades de grandes lucros e de geração de empregos, que exige, em contrapartida, muito investimento e qualificação da mão-de-obra. Nesse cenário, e mais especificamente na América Latina, o Brasil tem uma inserção importante tanto pelo potencial de geração de renda quanto na criação de novos produtos e serviços, ainda que deficiências históricas venham dificultando grandes saltos.

Segundo dados da Associação Brasileira de Software (ABES), o mercado de tecnologias de informação (TI) movimentou 11,9 bilhões de dólares no país em 2005, e os gastos tanto de empresas privadas quanto do setor público vêm crescendo anualmente. A consultoria IDC Brasil aponta que somente o governo gastou 4,3 bilhões no setor, no mesmo ano, principalmente em serviços como VoIP e segurança. Os gastos em hardware concentram-se principalmente na renovação e padronização dos servidores. A IDC aponta que, no mundo inteiro, os gastos em TI em 2006 foram da ordem de 1,6 trilhão de dólares, e o aumento anual até 2010 deve ser de 6%. Deste valor, aproximadamente 50% corresponde ao segmento de serviços.

O setor tem passado por diversas transformações ao longo do tempo, modificando os nichos econômicos que representa, conforme aponta Paulo Bastos Tigre, coordenador do Grupo de Pesquisa em Economia da Inovação, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

 

 

O pesquisador julga que, atualmente, o mercado mais promissor para o segmento de TIC seja o de software e o de serviços. No período de vigência da lei de reserva de mercado da informática no Brasil, acreditava-se que o grande filão era a fabricação de hardware. Empresas nacionais como a Cobra - Computadores e Sistemas Brasileiros, por exemplo, puderam crescer e se estabelecer. Hoje, porém, a fabricação de hardware está, na prática, nas mãos de duas grandes gigantes do setor, a Intel e a AMD, que monopolizam o mercado. "Boa parte da complexidade de um computador de mesa moderno migrou para dentro do chip da Unidade Central de Processamento (CPU, na sigla em inglês), que se tornou extremamente elaborado. Uma CPU moderna contém dezenas de milhões de transistores. Excetuando-se a CPU, o que resta dos circuitos internos de um computador é relativamente simples", diz Paulo Tigre. Maria Aparecida Galhardo, professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e analista de sistemas do Banco Itaú, concorda com Tigre: "atualmente, os tradicionais fabricantes de hardware estão se voltando para a prestação de serviços. Segundo a empresa de consultoria norte-americana Gartner, que se dedica à análise e pesquisa de assuntos relacionados com as TICs, até 2008, mais de 30% das grandes empresas terão seus analistas de negócios e de sistemas trabalhando em arquiteturas orientadas a serviços. Já estamos vendo as grandes empresas se mobilizando e começando a seguir essa tendência".

DIFERENTES SEGMENTOS DO SOFTWARE

Em relação à produção dos softwares, o setor é muito amplo e apresenta muitos desafios. O mercado para sistemas operacionais, que são os aplicativos que fazem a comunicação entre o hardware e os demais programas do computador, exibe hoje uma forte tendência de concentração entre as líderes mundiais, principalmente devido à dependência tecnológica do cliente em relação aos seus sistemas. A Microsoft, proprietária da plataforma operacional Windows e do pacote Microsoft Office, detém cerca de 95% do mercado de sistemas operacionais para desktops (computadores de mesa), liderança que tem se mantido constante ao longo dos últimos anos.

Já o mercado para aplicativos tem uma distribuição um pouco maior entre os fabricantes, embora existam também setores tradicionalmente dominados por uma única empresa. Uma das mais fortes nessa área é a Adobe, que produz aplicativos gráficos e de editoração. A empresa detém a propriedade intelectual do Adobe Photoshop, que se tornou o padrão de mercado para edição de imagens digitais. "Esse é um mercado que não convive bem com muitos padrões simultâneos. Com o passar do tempo, o que nós assistimos é a hegemonia de um padrão único", explica Paulo Tigre. Outro exemplo seria o AutoCAD, da Autodesk, software para desenho industrial e arquitetura.

Exceto em alguns nichos específicos de software-produto, não se pode dizer que estejam abertas grandes oportunidades de desenvolvimento para fabricantes brasileiros. A área de serviços, contudo, tem-se tornado cada vez mais uma área "não exatamente de TI", mas "habilitada por TI" e envolve outras especialidades. Ou seja, aqui o outsourcing ganha o papel de destaque.

"Hoje, o outsourcing é uma tendência muito forte entre empresas de tecnologia da informação", aponta o pesquisador da UFRJ. "Nos anos 1970, empresas como a IBM tinham todos os setores da atividade dentro de suas unidades: ela fabricava o chip, o hardware e o integrava aos computadores. Eles tinham técnicos capacitados para instalar e configurar os equipamentos na empresa cliente, assim como pessoal para treinar e capacitar para a operação das máquinas. Com o passar do tempo, mantendo-se com uma estrutura tão verticalizada, a multinacional percebeu que não conseguiria acompanhar o ritmo de exigências em inovação que a área impulsionava, e foi saindo de alguns setores, como, por exemplo, treinamento e fabricação de hardware", pontua o economista.

A necessidade de se concentrar na atividade principal faz com que as empresas em geral se desfaçam de segmentos de seus negócios (os que não são considerados estratégicos), e terceirizem serviços, contratando fabricantes especializadas. "O banco ABN-AMRO, por exemplo, depois de algumas experiências mal-sucedidas com TIC, resolveu contratar uma empresa, a IBM, para cuidar do assunto. Hoje, a IBM é a responsável pelas máquinas de atendimento aos clientes e caixas eletrônicos".

MERCADO DE TRABALHO

Da mesma forma, observa-se a explosão dos setores de call-center, serviços de suporte e manutenção, e até mesmo de assessoria de imprensa. Estes são serviços que se baseiam em TI, mas envolvem outras habilitações, como contabilidade, gestão de pessoal, relacionamento com o cliente e fluência em inglês. É um setor com grandes demandas de pessoal qualificado, porém com exigências de conteúdos que nem sempre um candidato a um posto de trabalho domina. Paulo Tigre aponta três áreas de conhecimentos exigidas: informática, inglês e conhecimento em processos e negócios. Para um jovem que busca entrar no mercado de trabalho nos últimos tempos, o domínio da informática e do inglês não é exatamente um problema, pois cresceu muito a capacitação nessas duas áreas. No entanto, ainda falta pessoal com experiência em negócios.

 

 

Sandro Alves, diretor do Instituto Nokia de Tecnologia, concorda com a necessidade de educação de alto nível, e a aponta como um dos entraves para o aproveitamento das oportunidades que o setor representa. "A expansão da mão-de-obra qualificada contribuirá para que regiões onde esse nicho é representativo se desenvolvam, inclusive socialmente, cada vez mais rápido". O Instituto Nokia está instalado no Porto Digital de Recife, e dedica-se à pesquisa em tecnologias de comunicação móvel.

O economista da UFRJ afirma que, comparado ao setor de serviços, o segmento profissional de software-produto ainda emprega pouco. "No Brasil, a Microsoft emprega cerca de 400 pessoas, ou seja, quase ninguém, para um faturamento em torno de R$ 600 milhões de reais. Já a IBM, que se dedica muito mais à prestação de serviços do que a Microsoft ocupa cerca de 10 mil trabalhadores no país", diz Tigre.

Grande parte dos empregos gerados no setor de TIC tem sido em empresas pequenas e médias, principalmente as inovadoras. Só o Centro Empresarial para Laboração de Tecnologias Avançadas (Celta), incubadora de empresas da Fundação Certi (Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras), de Florianópolis, gera 700 empregos diretos em 40 empresas incubadas cujo faturamento chegou, em 2005, a 40 milhões de reais. O Cietec, instalado na Universidade de São Paulo, saltou de 203 postos de trabalho em 2001 para 701 em 2005.

"Outro processo que tem sido objeto de estudo em nosso grupo de pesquisa é o chamado business process outsourcing", acrescenta. Nesse caso, o entrosamento entre a empresa contratante e o prestador de serviços é maior, pois segmentos do próprio processo de negócios foram terceirizados. Do ponto de vista econômico, a idéia de se concentrar na real habilidade da empresa faz muito sentido, mas, na prática, o outsourcing também tem seus problemas. A empresa contratada deve demonstrar confiabilidade e saúde financeira. O serviço ficaria indisponível se a empresa prestadora de serviço quebrar. A empresa contratante pode tentar trazer de volta a capacitação para seu domínio, mas as pessoas que dominavam aquele conteúdo já não estão mais presentes, ou estão defasadas.

 

 

O gerente de negócios da unidade brasileira da multinacional francesa Mandriva, Paul Guillet, enxerga alguns problemas na prática indiscriminada de outsourcing adotada por muitas empresas. Os planos da Mandriva Brasil, segundo Guillet, são de estimular o desenvolvimento de projetos localmente, ao invés de considerar o país apenas como uma fonte de mão-de-obra barata. A Mandriva é o resultado da fusão, ocorrida em fevereiro de 2005 de quatro empresas de TIC: as francesas Mandrakesoft e Edge IT, a brasileira Conectiva, com sede em Curitiba, e a americana Lycoris. Desde então tem aumentado o volume de negócios no Brasil. Atualmente a empresa mantém um centro de pesquisa e desenvolvimento em Manaus, que se dedica principalmente ao desenvolvimento de suporte a periféricos para o sistema operacional Mandriva, além de melhorias no desktop e na interface com o usuário. Segundo Paul Guillet, "dentro da filosofia de estimular projetos locais, a Mandriva tem vendido expertise brasileira para projetos globais, em regiões como a Índia e o Oriente Médio". Para a empresa de origem francesa, o Brasil é um mercado muito ativo, e um ponto estratégico para a entrada no mercado latino-americano.

 

 

PARTICIPAÇÃO DO SETOR PÚBLICO

As opiniões sobre a política setorial do governo brasileiro para a área da TIC se dividem. Guillet descreve o governo como extremamente ativo em se tratando de estímulo ao setor e à inclusão digital. Diz ainda que o programa PC para Todos permitiu o surgimento na empresa de uma atividade girando em torno de produtos OEM (Original Equipment Manufacturer), — obtidos por fabricantes que integram uma tecnologia de maneira independente — e Linux que era inexistente até 2005.

Sérgio Rosa, diretor do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), considera que a Lei de Inovação Tecnológica sancionada pelo governo é um marco na disseminação do conhecimento gerado na universidade. Para ele, o programa PC para Todos citados por Guillet foi vitorioso em sua proposta, reduzindo o preço do computador básico de R$ 1800 para R$ 1200.

E quando o assunto é governo eletrônico, o Serpro surge como um grande inovador. Sistemas que hoje já são habituais na rotina do brasileiro, como o Receitanet, o Renavam e o IRPF online são desenvolvidos pelo órgão, que planeja, para 2007, a produção do novo passaporte brasileiro, com informações biométricas do portador. Há também a implementação da nota fiscal eletrônica e do uso da certificação digital para os contribuintes, aumentando a segurança das transações. O Serpro é também uma Autoridade Certificadora e de Registro, na Infra-estrutura Brasileira de Chaves Públicas (ICP-Brasil), mantida pela Rede Nacional de Pesquisa (RNP).

Para Maria Aparecida Galhardo, da FGV, porém, ainda há muito por se fazer. "É preciso investir na TV digital, simplificar os mecanismos de acesso aos programas de inovação por meio de incentivos fiscais, fortalecer centros de pesquisa e desenvolvimento para as empresas, e, também, facilitar o acesso a financiamentos, dando ênfase à infra-estrutura e ampliando o campo de atuação dos pesquisadores". Ela defende que o governo estimule a ida de pesquisadores para a empresa privada, uma vez que menos de 5%, dos cerca de oito mil doutores formados por ano, seguem esse caminho.

 

 

REDE NACIONAL DE PESQUISA

A RNP desenvolve diversas atividades de inovação no uso de redes avançadas. O serviço fone@RNP, por exemplo, já está em produção, e provê telefonia IP para instituições interessadas. A diretoria de inovação da RNP mantém grupos de trabalho com duração de um ano, e que são aceitos para trabalho via edital público de chamada. O Grupo de Trabalho de Redes Mesh, por exemplo, está implementando um projeto piloto na Universidade Federal Fluminense (UFF), e é coordenado pelo professor Célio Vinícius Neves de Albuquerque, do Departamento de Ciência da Computação. Redes mesh são aquelas cujos pontos participantes são capazes de se comunicar entre si de maneira mais eficiente e dinâmica do que em redes convencionais, onde roteadores fazem a comunicação somente entre os pontos participantes e a internet.

Albuquerque e sua equipe fizeram a adaptação de roteadores Linksys para o funcionamento em modo mesh, modificando o software que roda no aparelho para usar o OpenWRT, um sistema operacional desenvolvido especialmente para roteadores. A idéia do projeto é ampliar o alcance da rede do campus de São Domingos da UFF para o entorno, onde existem muitos prédios residenciais. "Percebemos que muitos desses prédios eram habitados por alunos dos nossos cursos de graduação e pós, e também por funcionários da universidade. Era um cenário ideal para teste de rede mesh", explica Albuquerque.

Foram então colocados roteadores Linksys modificados nos terraços de alguns prédios próximos ao campus, fazendo a ligação com outros nos prédios da própria UFF, completando uma rede sem fio. Desta forma um pedido de rede oriundo de um ponto distante pode ser re-encaminhado por uma série de roteadores mesh, até atingir o roteador mais próximo da internet, onde vai seguir seu destino.

Atualmente a RNP e a UFF estão iniciando a segunda fase do projeto, e avaliando a viabilidade de oferecer o serviço no rol dos demais serviços mantidos pelo órgão para instituições acadêmicas.

Outros grupos de trabalho incluem temas como TV digital, armazenamento em rede, e medições de tráfego da rede acadêmica. As tecnologias desenvolvidas pela RNP ficam à disposição de pesquisadores e instituições acadêmicas. A transferência de tecnologia para empresas privadas também é possível, embora não seja o foco principal de trabalho da Rede.

TV DIGITAL

TV digital também é assunto tratado pela Finep, que investiu R$ 38 milhões no desenvolvimento do Sistema Brasileiro de TV Digital, SBTVD. Foram 22 projetos em chamada pública, que encaixados conjuntamente formariam o sistema. Nas palavras de André de Castro Pereira Nunes, analista de projetos da Finep, "a interatividade do sistema era o que justificaria o investimento. Isso porque era uma maneira de promover a inclusão digital através da TV. Segundo dados do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística], a TV entra em cerca de 95% nos lares brasileiros. Então era natural que ela fosse escolhida, em vez do computador, que tem uma distribuição muito inferior".