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Inovação Uniemp

versão impressa ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp v.3 n.5 Campinas set./out. 2007

 

 

Bem-me-quer, mal-me-quer: empresa e governo em busca da inovação

 

 

NEWTON HIRATA

 

 

O tema inovação tem sido intensamente debatido nos últimos anos no Brasil, tanto pelo governo e academia como pelo setor empresarial em seus papéis como os principais atores no chamado sistema nacional de inovação. Da mesma forma que durante os anos 1990 o país, de uma forma geral, e as empresas em particular vivenciaram o movimento da qualidade total, alguns especialistas acreditam que a inovação é o grande tema dos anos 2000.

Foi a partir de 2001, com a realização da 2ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação pelo MCT, que governo e sociedade passaram a discutir o tema mais intensamente, momento em que a inovação foi incorporada ao binômio C&T no discurso governamental. Entretanto, dentre outras iniciativas, vale destacar que em 1980 surgiu a Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica (Abipti), em 1984 foi criada a Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (Anpei) e, em 1987, a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec).

Essas três associações — que têm em comum a busca do desenvolvimento tecnológico — envolvem institutos de pesquisa, sobretudo públicos na maior parte do tempo, empresas que declaradamente investem em pesquisa, desenvolvimento e inovação, universidades e incubadoras tecnológicas. Dado o tema em comum, visto sob diferentes perspectivas, em 1997 elas criaram a Aliança Estratégica para Promoção da Inovação Tecnológica, como uma tentativa de unir esforços, trocar informações e fortalecer uma representação institucional para discutir políticas de inovação no país.

Mais diretamente relacionadas ao setor empresarial, pode-se citar algumas iniciativas voltadas ao incremento do esforço inovativo, tais como: a Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizou, em 2007, o II Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria; as Federações Estaduais e Associações de Indústrias têm colocado em suas agendas o tema inovação tecnológica; neste mesmo ano, se discutiu "Inovação, Competitividade e Inserção Internacional" na VII Conferência ANPEI; a Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec) tem realizado vários eventos para falar de inovação e de acesso a recursos; o Fórum de Líderes Empresariais, o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o Movimento Brasil Competitivo e o Sebrae também discutem a inovação como forma de aumentar a competitividade das empresas.

Do lado governamental, MCT, Finep, CNPq, Capes, MDIC e BNDES em suas políticas, programas, editais e discursos têm enfatizado o papel estratégico da inovação em suas respectivas áreas de atuação e influência. Em 2004 foi criada a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI); o IBGE recentemente divulgou os resultados da Pintec 2005 e há dois anos o Ipea publicou uma extensa pesquisa sobre a relevância da inovação tecnológica no desempenho das indústrias brasileiras. Também não se pode esquecer o trabalho realizado pelas secretarias estaduais e municipais de C&T e, principalmente, pelas fundações estaduais de amparo à pesquisa.

 

É NECESSÁRIO HAVER SINERGIA DE ESFORÇOS

Atestada e reconhecida a importância da inovação pelos setores público e privado, em que medida há convergência desses esforços? Existe uma sinergia que conduza a melhores resultados em termos de inovação às empresas e ao país? Se por um lado, a literatura aponta para um modelo sistêmico e para a interação cada vez maior entre os diferentes atores no processo de inovação, pode-se dizer que no Brasil esta é uma realidade ainda incipiente.

Após entrevistas com representantes da Aliança Estratégica para Promoção da Inovação, verifica-se a dificuldade de se construir políticas públicas consistentes e principalmente de garantir que elas, de fato, se sustentem e atendam às demandas do setor empresarial. O atendimento dessas demandas não se refere às já conhecidas políticas protecionistas para tão somente resguardar a indústria nacional. Implica, sim, em identificar a perspectiva e necessidade do usuário com a possibilidade de melhorar a qualidade das políticas públicas e aumentar a competitividade internacional do país.

Há um consenso quanto ao fato da inovação acontecer na empresa e, como as experiências de outros países têm demonstrado, ela não está sozinha nesse processo de inovar. Ao contrário, é de fundamental importância a existência de políticas públicas perenes e consistentes de estímulo à inovação, bem como maior proximidade com universidades e centros de pesquisa que fornecem subsídios essenciais à capacidade de inovação das empresas.

O diálogo entre setor empresarial e governo brasileiro, entretanto, embora constante, não tem sido eficaz no sentido de se criar instrumentos capazes de contribuir para o aumento da competitividade das empresas. O contingenciamento dos Fundos Setoriais e a burocracia quanto ao acesso aos recursos públicos, por exemplo, têm sido assinalados como prejudiciais ao esforço inovativo. Assim como em outras áreas, faltam recursos, estudos prospectivos, visão de longo prazo e planejamento estratégico por parte do governo. E quando se fala em pesquisa, desenvolvimento e inovação, essas são questões cruciais.

Há por outro lado, uma certa expectativa — ora cética, ora otimista — quanto aos benefícios da aplicação da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), da Lei de Inovação, da chamada Lei do Bem e dos recursos do BNDES e do incentivo ao capital de risco. Além disso, as diferentes iniciativas públicas e privadas, ainda que muitas vezes isoladas, no médio prazo podem se complementar e contribuir para intensificar a busca pela inovação.

Como fator atenuante dessa realidade, é preciso lembrar que a preocupação com a inovação ainda é algo relativamente novo no país. Não há uma cultura, uma tradição em se investir em P&D. Salvo algumas poucas empresas e setores que de fato pautaram seu desenvolvimento em inovação tecnológica, a grande maioria das empresas tinha outras preocupações que no momento eram mais caras, ou simplesmente negligenciaram a inovação como fator de aumento de sua competitividade.

 

 

Da mesma forma que existem críticas quanto à postura governamental, deve-se registrar também, a própria dificuldade de articulação do setor empresarial em torno de suas demandas e de uma agenda comum para inovação. Problemas de organização, planejamento estratégico e visão de longo prazo são críticas que também cabem ao setor empresarial de uma forma geral.

A dificuldade da combinação de interesses e ações e a dificuldade da incorporação do setor empresarial como um ator ativo no processo de formulação de políticas de inovação encontram possíveis explicações na análise de quatro culturas políticas: a cultura burocrática (governamental), econômica (setor empresarial), acadêmica e cívica (2). Cada uma delas tenta defender seus interesses e direcionar os rumos das políticas de CT&I. No Brasil, historicamente, há uma clara identificação da cultura burocrática e acadêmica na condução desse processo. Todavia, verifica-se que, cada vez mais, a cultura econômica tem reivindicado um espaço maior nessa arena de negociações.

A dificuldade de se ter uma agenda comum, não se deve apenas às características particulares de cada cultura, com suas dinâmicas, objetivos, valores e crenças; mas também às subculturas. Ou seja, deve-se analisar em que medida as diferentes entidades no âmbito do governo e as diferentes associações e setores empresariais dispersam esforços e energia fundamentais às iniciativas para inovação.

Este artigo não tem como endereço o governo como alvo de críticas nem tampouco a defesa dos interesses empresariais. O objetivo é apenas evidenciar a necessidade de esforços mais concentrados e coordenados que levem as empresas e o país, a obterem resultados mais claros e positivos a partir das diferentes iniciativas colocadas em prática.

 

Newton Hirata é professor adjunto da Academia da Força Aérea, bacharel em administração pela UEM, mestre e doutor em ciência política pela FFLCH/USP.

 

 

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS

1. O tema do presente artigo foi apresentado e debatido no Seminário de Pesquisa do PGT/USP em maio de 2007

2. Elzinga, Aant; Jamison, Andrew. "Changing policy agendas in science and technology". In. Jansanoff, Sheila (et al.). Handbook of science and technology studies. London: Sage Publications, 1995.