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Inovação Uniemp

Print version ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp vol.3 no.5 Campinas Sept./Oct. 2007

 

 

 

One laptop per child: inovação para a educação

 

 

por BRUNO BUYS

 

 

ECONOMIA DE ENERGIA, RESISTÊNCIA E DURABILIDADE SÃO ALGUNS DOS ATRIBUTOS DA MÁQUINA QUE ESTÁ SENDO DESENVOLVIDA POR ONG DO MASSACHUSETTS INSTITUTE OF TECHNOLOGY

Como forma de resolver os problemas encontrados para criar um laptop econômico e viável para crianças dos países em desenvolvimento, a OLPC (One Laptop Per Child) desenvolveu novidades tecnológicas com grande potencial para interessar fabricantes de laptops convencionais. A OLPC é uma organização sem fins lucrativos (ONG) fundada por pesquisadores do Laboratório de Mídia do Massachusetts Institute of Technology (MIT), responsável pela concepção dos famosos laptops de 100 dólares e está testando as primeiras gerações de seu laptop educacional X0 no Brasil, Argentina, Nigéria, Líbia e Tailândia. Junto ao X0, testa também as inovações que tiveram que ser desenvolvidas para o projeto.

Desde seu início, o X0 foi pensado como um laptop diferente: ele deveria ser feito para permanecer junto a cada criança, ao invés de pertencer à escola, seguindo a filosofia explícita no nome "Um laptop por aluno". A criança o levaria para casa, o que lhe dá muito mais tempo e oportunidade para explorar os recursos disponíveis do que em tradicionais aulas de informática, de algumas poucas horas por semana.

Para operar confiavelmente nas condições encontradas pelas crianças dos países em desenvolvimento, principais clientes do projeto, o laptop deveria ser econômico, resistente e durável. Nesses países, o acesso à internet é muito restrito e até o acesso à rede elétrica pode ser um desafio. Portanto, em relação ao hardware usado na máquina, foram desenvolvidas maneiras de estender ao máximo a autonomia da bateria, compartilhar a internet e tornar a máquina mais resistente à operação de seus pequenos donos.

O problema do acesso à internet, foi resolvido da seguinte forma: o laptop possui rede WiFi sem fio embutida, padrão 802.11, funcionando em modo mesh. Nesse modo, cada laptop em operação torna-se não só um receptor de pacotes internet como também um transmissor. Isso significa que em uma turma de alunos, com seus laptops ligados, cada unidade auxilia as demais na conexão com a internet, funcionando como uma rota para envio de dados. Esse modo colaborativo de funcionamento pode também se mostrar eficiente quando as crianças forem para casa, se morarem próximas. Testes em uma região rural da Austrália demonstraram que dois laptops podem se conectar e trocar dados em distâncias de até 1200 metros. E quanto mais máquinas ligadas e próximas, melhor. O programa de roteamento de internet monitora continuamente qual o melhor caminho para enviar e receber informações de rede.

Na verdade, a conectividade mesh não é benéfica somente para acesso à internet. Ela é essencial mesmo para os propósitos educacionais do laptop. A idéia é que, quando uma criança liga o seu laptop, ele detecta a rede mesh existente e entra automaticamente, podendo ver quem está ali (colegas de turma em outros laptops) e compartilhar arquivos, trabalhos e fazer tarefas em conjunto. Por exemplo, uma turma pode desenhar conjuntamente, pois o desenho vai sendo mostrado nas telas de todos os participantes.

 

 

James Gettys, vice-presidente de software da OLPC esteve no Brasil, em abril passado, apresentando o laptop no 8º Fórum Internacional de Software Livre. Ele diz que "o laptop X0 consegue operar a rede mesh sem precisar ligar a CPU principal, e, por causa disso, pode-se esperar que consiga manter a rede funcionando por 40 horas sem parar, em uma única carga".

Na área de economia de energia, o laptop tem uma série de tecnologias inovadoras. Mary Lou Jepsen, diretora de tecnologia da OLPC, diz que foi necessário estudar os laptops convencionais e ver onde esses computadores desperdiçavam energia. Muitos deles possuem tecnologias para atenuar o consumo elétrico de partes ociosas, mas o X0 foi radical nesse sentido. Ele é capaz de desligar inteiramente sua CPU, por exemplo, quando está ocioso. A CPU, aliás, um AMD Geode, consome meros 0.8 watts de energia em funcionamento. Um processador Pentium para desktops convencionais pode chegar a consumir entre 60 a 90 watts. A tela de cristal líquido do X0 possui modos de funcionamento que não dependem de CPU. E esta, sempre que é desligada, resulta em mais economia de energia.

James Gettys cita uma estimativa recente que contabiliza cerca de 15 mil escolas brasileiras sem acesso à energia elétrica; em países da África esse número pode ser ainda maior. Segundo ele, a eficiência em uso de energia elétrica pode ter implicações importantes na economia de combustível de regiões remotas que usam geradores elétricos movidos a gasolina ou diesel.

O produto possui variadas formas de uso, como laptop convencional (tela e teclado), leitor de e-books (com o teclado rebatido por trás da tela), proporcionando uma empunhadura ergonômica para crianças, e como estação de games. Portanto, economizando energia da CPU quando usado somente para leitura em modo e-book, o laptop pode ser uma alternativa à tradicional solução escolar de livros-texto de papel, de distribuição cara e difícil logística.

A tela de cristal líquido pode funcionar em dois modos, um com cores e outro em preto e branco. O modo em preto e branco é para uso em leitura de e-books, com alta-definição (200dpi). O modo em cores é padrão, para demais usos. No modo em preto e branco a tela pode ser lida até mesmo contra o sol. Segundo Mary Lou Jepsen, isso é importante, uma vez que em muitas regiões do globo o termo escola não significa necessariamente uma construção fechada. "Muitas crianças têm aulas em espaços abertos, e — especialmente na África— com muito sol". Mary Jepsen, especialista em tecnologias de displays, ressalta que essa diferença é, nesses lugares, a diferença entre uma máquina usável ou não.

A experiência tem mostrado que as partes mais vulneráveis de um laptop convencional são os discos rígidos e as conexões internas. Por isso, o X0 não possui discos rígidos (e nenhuma outra parte móvel, na verdade, como drives óticos ou ventoinhas de dissipação). Suas memórias internas são feitas de chips flash, capazes de reter informação depois de desligados. Na memória flash residem tanto o sistema operacional, quanto os programas e arquivos do usuário. Eliminando os discos rígidos obtém-se também uma boa economia de energia, mas às custas de uma série de críticas que foram feitas ao projeto.

 

PROJETO É DE EDUCAÇÃO E NÃO DE LAPTOP

Dois pontos fracos comumente apontados são que o laptop tem baixa capacidade de armazenamento (e também de processamento). Para rebater essa crítica, os integrantes da OLPC argumentam que era necessário fazer opções. Como ele é desenhado para um público muito específico, é mais importante que esteja equipado para resistir ao dia-a-dia deste público, do que ser um laptop rápido e eficiente, como estamos acostumados a esperar quando compramos um.

No website do projeto, em www.laptop.org, a mensagem do presidente da OLPC, Nicholas Negroponte, fica clara logo no início: "É um projeto de educação, não um projeto de laptop". O usuário tem, no entanto, a opção de transferir seus arquivos pela internet (para uma conta gmail, por exemplo), ou usar as quatro portas USB disponíveis para anexar pendrives e ter espaço adicional de armazenamento.

No Brasil, segundo James Gettys, existem cerca de 200 laptops em testes em escolas, universidades e nas mãos de programadores independentes. Ele aponta que excetuando os Estados Unidos, o Brasil deve ser o país com a maior quantidade de máquinas em teste, o que demonstra o entusiasmo pelo projeto.

"Nada como testes no mundo real, para avaliarmos a adequação das máquinas", diz Gettys. "A importância dos testes aqui no Brasil ficou clara quando fizemos uma demonstração em Porto Alegre, recentemente: nós queríamos que as crianças escolhessem apelidos para logarem-se na rede mesh, de maneira que todos pudessem "ver" seus colegas logados e trabalhar em conjunto. Porém, em Porto Alegre, 20% das crianças tinha nomes com caracteres acentuados. Nós não esperávamos isso, não aconteceu em testes nos EUA. Os nomes acentuados dispararam um bug inesperado no sistema operacional (que foi consertado rapidamente). Não há substituto para a experiência real".

Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a professora Léa Fagundes coordena o Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC), envolvido nos testes educacionais das máquinas. Um dos primeiros laboratórios brasileiros a receber as máquinas, o LEC está avaliando a adequação pedagógica dos equipamentos em parceria com a Escola Estadual de Ensino Fundamental Luciana de Abreu, em Porto Alegre.

 

 

Juliano Bittencourt, do LEC, ressalta a importância da máquina no aprendizado das crianças: "a possibilidade oferecida pelo laptop X0 é única. É um computador de baixo custo e com softwares abertos, o que permite que as crianças com inclinações técnico-matemáticas explorem o funcionamento da máquina. Dessa forma, educamos não somente usuários, mas também futuros programadores". Bittencourt, graduado em ciências da computação e mestre em educação, refere-se ao uso de softwares livres e abertos, escolha da OLPC para uso no X0. No site do projeto, pode-se baixar todos os softwares que a máquina usa, o que permite que qualquer interessado estude o seu funcionamento, inclusive as crianças.

A Rede Nacional de Pesquisas (RNP), também convocada para testes de conectividade do aparelho, tem um Grupo de Trabalho de Redes Mesh, que envolve pesquisadores da UFF, UFRGS, UnB, UFPB, USP e UFAm. Como o Brasil é muito extenso e heterogêneo, a necessidade de testar o aparelho em diferentes contextos ambientais é reconhecida por todos que estão envolvidos no projeto.