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Inovação Uniemp

versión impresa ISSN 1808-2394

Inovação Uniemp v.3 n.5 Campinas sep./oct. 2007

 

 

Expedição Vaga-Lume: iluminando a Amazônia com literatura

 

 

por PATRICIA MARIUZZO

 

 

Há sete anos, três jovens moradoras da cidade de São Paulo, sensibilizadas com o difícil acesso à leitura pelas comunidades rurais na região Norte do país, lançaram-se em um desafio incomum para mulheres da sua idade: levar livros para escolas rurais da Amazônia. O projeto foi batizado de Expedição Vaga-Lume: expedição, por trabalhar em lugares remotos e vaga-lume porque elas queriam iluminar as comunidades com as luzes dos livros, como faz o inseto. Para viabilizar a empreitada criaram a Associação Vaga-Lume e, firmadas as primeiras parcerias para produção de material de divulgação, compra de livros, design e produção de estantes, a Expedição Vaga-Lume iniciou suas atividades em campo, com um projeto piloto em duas comunidades no estado do Pará.

O registro das primeiras intervenções foi a principal ferramenta para captar recursos que possibilitariam avançar por toda a Amazônia Legal brasileira que compreende nove estados: Mato Grosso, Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará, Amapá, Maranhão e Tocantins. Após contabilizar na primeira fase, 84 bibliotecas, mil mediadores capacitados e alguns prêmios, Sylvia Guimarães, Maria Teresa Meinberg e Laís Fleury coordenam a segunda fase da Expedição que inclui visitas às comunidades beneficiadas, dando continuidade ao trabalho e profissionalizando sua estrutura. A associação conta com uma importante rede apoiadora formada por empresas como a multinacional espanhola Guascor, a Votorantim, o BNDES, os Correios e a Gol Linhas Aéreas. O Banco da Amazônia, por exemplo, patrocina o projeto, desde 2004, por meio da Lei Rouanet. Segundo Ricardo Merícias, coordenador de marketing do banco, participar desse tipo de projetos agrega valor às ações de responsabilidade social da empresa. "É importante que a comunidade reconheça uma empresa socialmente responsável. Com isso podemos fortalecer nossa marca, hoje, o maior ativo da empresa e chave do sucesso comercial", afirma ele.

 

 

O contingente de leitores no Brasil ainda é muito pequeno em relação à sua população. Segundo o Centro Regional para Fomento do Livro na América Latina (Cerlalc), apenas 10% dos brasileiros compraram pelo menos um livro no último ano. A média anual de leitura é outro índice preocupante: 1,8 contra 7 na França, 5,1 dos Estados Unidos, 5 da Itália e 4,9 da Inglaterra. A familiaridade com a leitura não é adquirida de forma espontânea. Dados do Ministério da Cultura indicam que as nações desenvolvidas produzem seus leitores em larga escala e que em todas elas há um fator em comum: o estímulo à leitura na família e na escola.

Para Sylvia Guimarães, atual presidente da Associação, a falta de permanência dos projetos educacionais do poder público atrapalha a democratização da leitura no país. Assim como a alta rotatividade das pessoas à frente da área de educação. "Tem lugares onde trabalhamos há muito tempo, mas todo ano temos que nos apresentar para a secretaria de educação", lamenta. A maioria das bibliotecas montadas pela Expedição na região amazônica fica dentro de escolas. Questionada sobre a razão de ir tão longe quando escolas da periferia de São Paulo também sofrem com a falta de livros, ela diz que apesar de existirem muitas escolas sem biblioteca na capital paulistana, existem mais recursos para acesso à leitura, defende. Segundo ela, a idéia é fazer com que a biblioteca possa funcionar como um elo de ligação entre a escola e a comunidade. "Quando a biblioteca e a escola contam com a participação dos pais, dos alunos e de outras pessoas não necessariamente ligadas ao ambiente escolar, elas tornam-se espaços verdadeiramente comunitários", diz. E defende que "Uma biblioteca é um patrimônio coletivo, e deve ser administrado e zelado pela comunidade".

 

 

 

 

CONHECIMENTO LOCAL

Para incentivar essa postura participativa a metodologia desenvolvida pela Expedição Vaga-Lume está fundada na concepção de que a entrega de recursos materiais deve vir acompanhada da capacitação de pessoas para utilizá-los e do estabelecimento de rotinas para sua inserção no cotidiano. O trabalho nas comunidades se inicia com uma visita de diagnóstico das condições locais para implantação e fortalecimento das ações de acesso ao livro e à leitura. A área de atuação da Expedição Vaga-Lume, a Amazônia Legal Brasileira, é um vasto território com paisagens e características bem diferentes. Em seus nove estados há comunidades ribeirinhas, garimpeiras, agrícolas, pesqueiras e missões religiosas. é feito o planejamento do trabalho para formar professores e pessoas da comunidade como mediadores de leitura, estimular a gestão comunitária de bibliotecas, facilitar o envio de livros para a região e monitorar as ações desenvolvidas nas bibliotecas implantadas.

"O projeto só funciona se estiver conectado com a realidade local. Quanto mais nos misturamos com a comunidade, mais a Expedição dá certo", explica Sylvia. Os mediadores trabalham principalmente com as crianças, oferecendo livros, lendo com elas. "É uma ação simples, porém muito importante para a formação dos leitores, como a da mãe que lê para o filho à noite", conta Sylvia. A expedição promove também a capacitação de multiplicadores nas comunidades para dar cursos e fazer acompanhamento, diagnóstico e avaliação e disseminar o projeto em outras comunidades.

Certamente a conquista de novos leitores passa sempre pelo interesse e curiosidade que os livros podem despertar. Por isso a Expedição Vaga-Lume monta acervos com livros novos, de 150 a 300 exemplares, conforme o tamanho da comunidade. Como o foco são as crianças, a ênfase é dada à literatura infantil e infanto-juvenil. A fim de resgatar e valorizar narrativas, o passado dessas comunidades e seus contadores de histórias, são organizadas rodas para ouvir os moradores mais antigos. A partir dessas oficinas de história oral são criados livros artesanais. Alguns deles chegam até estudantes de escolas paulistanas por meio da Rede dos Vaga - lumes, outro programa da Associação, que promove o intercâmbio entre alunos e professores de escolas da Amazônia e de escolas da cidade de São Paulo, onde fica a sede da ONG.

Além disso elas buscam agora compartilhar sua vivência com a sociedade. A realização do "Congresso sobre incentivo à leitura na Amazônia", em julho deste ano, integra o conjunto de ações com essa finalidade. Na ocasião 74 pessoas — técnicos de secretarias de eduação, professores e lideranças comunitárias — de 19 municípios da Amazônia, estiveram na cidade de São Paulo para formar equipes para atuar na Expedição.